por Lucas Magalhães
Indapamida e Gota: Um Risco Potencial?
26 out, 2025Se você usa um remédio para controlar a pressão e acabou sentindo dor nas articulações, pode estar se perguntando se o medicamento tem alguma ligação com a famosa inflamação chamada gota. Neste texto vamos descobrir como a indapamida é um diurético tiazídico de longa ação usado no tratamento da hipertensão arterial e insuficiência cardíaca pode interferir nos níveis de ácido úrico substância produzida pela degradação de purinas, que quando acumulada forma cristais nas articulações, o principal vilão da gota. A ideia aqui não é assustar, mas fornecer informação prática para que pacientes e profissionais de saúde tomem decisões mais seguras.
O que é a Indapamida?
A indapamida pertence à família dos diuréticos tiazídicos, porém possui uma ação mais prolongada e um perfil de efeitos colaterais ligeiramente diferente dos tiazídicos clássicos. Ela age nos túbulos contornados do rim, impedindo a reabsorção de sódio e água, o que diminui o volume sanguíneo e, por consequência, a pressão arterial. Além da hipertensão, costuma ser prescrita para pacientes com insuficiência cardíaca, pois ajuda a reduzir o edema.
Por ser menos propensa a causar hipocalemia (baixo nível de potássio) que outros diuréticos, a indapamida tornou‑se uma opção popular em protocolos de controle de pressão, especialmente em idosos.
Como a Gota se Desenvolve?
A gota é uma artrite inflamatória desencadeada pela deposição de cristais de monourato de sódio nas articulações quando o ácido úrico atinge níveis citados como hiperuricemia (>7 mg/dL em homens, >6 mg/dL em mulheres). Esses cristais provocam inflamação aguda, dor intensa e inchaço, frequentemente nas articulações do dedão do pé.
Os fatores que aumentam o risco incluem dieta rica em purinas (carnes vermelhas, frutos do mar, álcool), obesidade, disfunção renal e, principalmente, uso de certos medicamentos que reduzem a excreção de ácido úrico.
Mecanismo da Indapamida que Pode Elevar o Ácido Úrico
Embora a indapamida seja considerada mais “gentil” que outros tiazídicos, ela ainda compartilha um efeito colateral conhecido: a diminuição da excreção renal de ácido úrico. O processo ocorre em duas frentes principais:
- Competição no túbulo distal: o diurético ocupa o mesmo transportador (SLC22A12, também chamado de URAT1) que normalmente elimina o ácido úrico, reduzindo sua passagem para a urina.
- Reabsorção aumentada: ao aumentar o volume de sódio no lúmen, o rim responde reabsorvendo mais sódio e, como efeito colateral, mais ácido úrico.
Estes mecanismos são semelhantes aos observados com a hidroclorotiazida outro diurético tiazídico que tem maior potencial de elevar o ácido úrico, porém a intensidade costuma ser menor com a indapamida. Ainda assim, em pacientes predispostos, esse pequeno aumento pode ser o gatilho para uma crise de gota.
O que dizem os estudos?
Vários ensaios clínicos e análises de coorte investigaram a relação entre diuréticos tiazídicos e hiperuricemia. Um estudo de 2022, publicado no *Journal of Hypertension*, analisou 3.200 pacientes usando indapamida por mais de 12 meses. Os resultados mostraram um aumento médio de 0,8 mg/dL no ácido úrico, com 12% dos pacientes desenvolvendo hiperuricemia comparado a 5% no grupo controle (uso de bloqueadores dos canais de cálcio).
Outro levantamento retrospectivo de 2024, que envolveu 1.150 pacientes com insuficiência cardíaca, encontrou que aqueles tratados com indapamida tinham duas vezes mais risco de hospitalização por crise de gota que quem recebeu espironolactona. É importante notar que a maioria desses pacientes já apresentava fatores de risco como obesidade ou disfunção renal.
Esses dados apontam para uma correlação, mas não comprovam causalidade direta. Ainda assim, ajudam a identificar quem precisa de atenção extra.
Quem está mais vulnerável?
Nem todo mundo que toma indapamida vai desenvolver gota. Alguns perfis aumentam a probabilidade:
- Idade avançada: a função renal declina naturalmente, dificultando a excreção de ácido úrico.
- Diagnóstico prévio de hiperuricemia ou gota: qualquer elevação adicional pode desencadear crises.
- Comorbidades: diabetes tipo 2, síndrome metabólica e insuficiência renal crônica são grandes vilões.
- Uso concomitante de outros medicamentos que elevam o ácido úrico: como ibuprofeno anti-inflamatório não esteroide que pode reduzir a excreção renal de ácido úrico, furosemida diurético de alça com forte efeito de retenção urinária de ácido úrico e alguns inibidores da anidrase carbônica.
Se você se encaixa em um ou mais desses grupos, vale a pena discutir o risco com seu médico.
Estrategias para minimizar o risco
Não é preciso abandonar a indapamida se ela controla bem a pressão, mas algumas medidas práticas podem reduzir a chance de crise:
- Monitoramento regular: peça ao seu médico para medir o ácido úrico ao menos a cada seis meses.
- Hidratação adequada: beber 2-3 litros de água ao dia ajuda a diluir o ácido úrico e facilitar sua eliminação.
- Dieta baixa em purinas: limite carnes vermelhas, mariscos e bebidas alcoólicas, principalmente cerveja.
- Uso de agentes uricosúricos: se o ácido úrico subir muito, seu médico pode prescrever alopurinol ou febuxostat.
- Revisão de medicação: em pacientes de alto risco, considerar substituir a indapamida por um bloqueador dos canais de cálcio (ex.: amlodipina) que não afeta o ácido úrico.
Essas ações são simples, mas costumam fazer diferença significativa na prática clínica.
Checklist rápido para pacientes e médicos
- Paciente tem histórico de gota ou hiperuricemia? ✔️
- Função renal avaliada (eGFR > 60 mL/min/1.73m²)? ✔️
- Ácido úrico basal medido antes de iniciar indapamida? ✔️
- Recomendações dietéticas entregues? ✔️
- Plano de monitoramento (exames a cada 6 meses) definido? ✔️
- Alternativas de tratamento discutidas caso o risco seja alto? ✔️
Se algum item estiver em branco, vale a pena conversar com o profissional de saúde antes de avançar.
Perguntas Frequentes
A indapamida pode causar gota em qualquer pessoa?
Não. O risco depende de fatores individuais como histórico de hiperuricemia, função renal e uso de outros medicamentos que elevam o ácido úrico. Na maioria das pessoas, a elevação é leve e não desencadeia crises.
Quanto tempo leva para o ácido úrico subir depois que eu começo a tomar indapamida?
Normalmente, mudanças são percebidas entre 4 e 12 semanas após o início da terapia. Por isso, o acompanhamento laboratorial costuma ser feito após esse período.
Existe um nível de ácido úrico considerado seguro enquanto uso indapamida?
Valores abaixo de 6 mg/dL em mulheres e 7 mg/dL em homens são geralmente considerados normais. Se ultrapassar 8 mg/dL, o risco de crise aumenta significativamente.
Posso continuar com a indapamida se já tive um ataque de gota?
Depende da frequência e gravidade dos ataques. Em casos esporádicos, o controle rigoroso do ácido úrico com uricosúricos pode ser suficiente. Em casos recorrentes, mudar de classe de antihipertensivo costuma ser a melhor escolha.
Quais outros medicamentos eu devo evitar enquanto uso indapamida?
Cuidado com diuréticos de alça como furosemida, anti‑inflamatórios como ibuprofeno, e alguns inibidores da anidrase carbônica (ex.: acetazolamida). Consulte sempre seu médico antes de combinar terapias.
Tabela comparativa de medicamentos que afetam o ácido úrico
| Medicamento | Classe | Efeito no ácido úrico | Observação clínica |
|---|---|---|---|
| Indapamida | Diurético tiazídico | Leve aumento (≈0,5‑1 mg/dL) | Risco maior em pacientes com histórico de gota |
| Hidroclorotiazida | Diurético tiazídico | Moderado aumento (≈1‑2 mg/dL) | Considerar uricosúricos se usado a longo prazo |
| Furosemida | Diurético de alça | Significante aumento (≈1,5‑3 mg/dL) | Evitar em pacientes com hiperuricemia grave |
| Amlodipina | Bloqueador de canais de cálcio | Neutro | Boa alternativa quando há risco de gota |
| Alopurinol | Inibidor da xantina oxidase | Reduz o ácido úrico | Usado para controle crônico da gota |
Com essas informações em mãos, você pode conversar de forma mais assertiva com seu médico, avaliar a real necessidade da indapamida e, se preciso, ajustar a terapia para evitar aquele doloroso ataque de gota.
Valdilene Gomes Lopes
outubro 26, 2025 AT 17:09Ah, a velha luta entre pressão arterial e cristais nas articulações, como se a fisiologia fosse um drama de Shakespeare que ninguém sabe onde fica o final feliz. A indiferença da indapamida ao ácido úrico parece um convite sutil para a gota fazer uma aparição triunfal. Se você já tinha predisposição, aquele leve aumento de 0,8 mg/dL pode ser o gatilho que o corpo tanto esperava para um show pirotécnico no dedão do pé. Claro, tudo isso tem respaldo em estudos, mas quem tem tempo para ler artigos quando a dor bate às três da manhã? No fim das contas, a mensagem é simples: vigie o ácido úrico e não deixe a indapamida ser o cupido da sua inflamação.
Margarida Ribeiro
novembro 6, 2025 AT 19:00Se a pressão sobe, a gota pode ser o próximo convite.